O Espírito Santo registrou mais de um caso de estupro de crianças por dia entre janeiro e julho deste ano. Os dados são da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp).
No dia 7 de agosto uma menina de 10 anos foi levada ao Hospital Roberto Silvares, em São Mateus, se queixando de dores abdominais. Na unidade, ela relatou que era estuprada por um tio desde os 6 anos e que nunca denunciou o crime porque era ameaçada por ele. A gravidez foi descoberta por um exame de sangue. O homem, de 33 anos, foi indiciado por estupro de vulnerável e ameaça, mas está foragido. A gestação foi interrompida por um procedimento médico em Pernambuco.
De janeiro a julho deste ano, 259 crianças de até 14 anos foram abusadas sexualmente em todo o estado.
Apesar do número alto de crimes registrados, houve uma redução das denúncias de estupro de vulnerável quando comparado ao mesmo período do ano passado. Nos sete primeiros meses de 2019, 423 crianças foram vítimas de violência sexual no Espírito Santo.
Essa diminuição dos registros, segundo a conselheira tutelar de Vila Velha, Alessandra Santana, não revela uma diminuição real na violência sexual contra crianças, mas uma possível subnotificação dos casos.
Isso porque, segundo ela, a principal forma de identificação dos crimes é feita na escola. Com as aulas suspensas por causa da pandemia do novo coronavírus, casos deixaram se ser percebidos e, consequentemente, denunciados.
“A gente recebe pelo menos um caso de violência por dia. Tem muita coisa ainda camuflada. Antes, a maior parte das denúncias eram recebidas por esses órgãos que têm acesso a essas crianças. Por isso, acredito que quando voltarem os atendimentos e todos os órgãos voltarem a trabalhar, principalmente a escola, esse número de casos notificados vão aumentar”, explicou a conselheira.
A juíza da Vara de Infância e Juventude de Vila Velha, Patrícia Neves, explicou que a violência sexual acontece principalmente dentro do círculo social das vítimas, sendo cometida principalmente por parentes e amigos da família da criança.
“Esse tipo de violência é mais comum por familiares e acontece porque as pessoas se sentem proprietárias do corpo do outro. Os filhos são considerados propriedades. E a gente vê que esse tipo de mentalidade precisa mudar”, declarou a juíza.
Os dados mais recentes sobre as vítimas de abuso sexual, um levantamento do Ministério da Saúde de 2018, apontam que a maior parte desses crimes é cometido contra meninas menores de 13 anos, dentro de casa, e cometidos por parentes ou amigos da família.
O Fórum Brasileiro de Segurança revela que os crimes sexuais são os menos denunciados para a polícia. A última Pesquisa Nacional de Vitimização, de 2013, estimou que apenas 7,5% das vítimas de violência sexuais registram o caso em uma delegacia.
Segundo o delegado titular da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), Diego Aleluia, isso acontece porque nem sempre a criança abusada conta para os pais que foi violentada ou tem mudança no comportamento, se tornando retraída ou agressiva.
“A criança pode ficar triste, ela pode não demonstrar nada porque muitas vezes a criança não liga aquilo a dor e acha que é uma forma de carinho e a mudança comportamental nem sempre é ligada a revolta, não é sempre sinônimo de tristeza. É muito difícil revelar esses casos se a criança não falar. Por isso que a gente pede para que os pais conversem com os filhos e tenham sempre o diálogo aberto”, orientou o delegado.